Sobre a Simulação Viva

"Simulação: praticando a vida";

"Simulação Viva é a simulação que a escola é"

“ O poeta é um fingidor, e finge tão completamente, que chega fingir que é dor a dor que deveras sente.”

Fragmento do poema Autopsicografia da autoria de Fernando Pessoa

Ao falar de simulação e modelismo na escola, temos primeiro que explicar o paradoxo dessas ferramentas no processo de ensino e aprendizagem dos jovens estudantes, ou podemos cair na armadilha de não falar de educação, e sim de propaganda.

Cabe a nós mostrarmos o quanto curioso é o contraponto entre nomenclatura e vivência quando estas se estabelecem nos processos escolares. Simular neste contexto não pode mais ser entendido como um propósito e, para isso, o fingir não pode traduzir o melhor entendimento desse verbete, que é o de representar. Usamos para isso os termos delegado e representação de modo proposital, com o fim de didaticamente estabelecer um distanciamento que esperamos que nossos(as) jovens assumam durante estes exercícios, afinal eles passam a ter a delegação de defender uma tese ou opinião e, por meio de uma representação, ensaiam o mundo real. Afinal, uma escola que não prepare seus alunos para o além muros deve ser de fato repensada.

Esta modalidade de ensinamento é relativamente nova no Brasil. No mundo universitário, surge em 1930 na Universidade de Harvard sob o formato de Clubes de debate. No fim dos anos 80, aparece nas universidades brasileiras e, no meio da primeira década deste novo século, reaparece como uma possibilidade de prática e apropriação de saberes para estudantes do Ensino Médio, sob diversas possibilidades para além dos tradicionais clubes de debate, surgem a: Simulação histórica, jurídica, coorporativa, temática, híbrida, econômica, administrativa, junto com modelos como os das Nações Unidas – MUN.

A Escola Viva olha para estas experiências e as incorpora junto com todo o ferramental pedagógico e teórico adquirido. Aplica como uma nova práxis ao tornar seus alunos protagonistas dos processos, liderando equipes de gestão de projetos, formulando cenários, desenvolvendo crises para agregar realismo aos exercícios, escrevendo livros, produzindo, filmando e editando documentação visual, elaborando os jornais e alimentando a mídia que envolve estas modalidades. Assim, nasce a Simulação Viva – SiV, com a premissa de forjar competências, saberes e habilidades para um mundo cada vez mais complexo, rompendo lugares comuns, pois torna de fato nossos estudantes em organizadores, formuladores, gestores e promotores da sua própria história.

A tarefa da Escola e de seus educadores é dar todo este suporte para construir asas, que os façam aprender a viver e voar, a fazer e liderar, não apenas entender.

Pablo Reimers Quijada

Professor

SiV's passadas (relatos)

2013 e 2014

Participei da SiV em 2013 e 2014, quando estava no 1º e 2º ano do Ensino Médio. Foi uma experiência bem bacana para mim, pois fiz parte da equipe de Imprensa com outros colegas de diferentes anos e alguns professores.

O evento acontecia no galpão de Artes ao lado do prédio do Ensino Médio e lá tínhamos uma mesa comprida nos fundos, onde parte da equipe de Imprensa acompanhava as discussões, tirava fotos, fazia ilustrações e então repassava esses materiais para a outra parte da equipe que ficava na Informática escrevendo, revisando e preparando os textos e ilustrações que iam para o jornal (ou boletim, como quiser chamar) interno de cada dia. Lá também disparávamos as postagens nas redes sociais, escolhíamos as famosas "pérolas" que eram piadas, graças e momentos divertidos proporcionados pelos delegados durante as calorosas discussões e defesas.

Era o que hoje chamamos de memes prontos! Lembro que durante o coffee break, todos voltavam para o prédio do Ensino Médio, e a equipe de Imprensa aproveitava o momento de pausa para finalizar (na correria!) todas as matérias, fotos e ilustrações do jornal e das redes sociais. Tínhamos ajuda dos professores de espanhol e inglês, porque as matérias eram traduzidas para esses idiomas também. Foram momentos bem legais, divertidos e muito trabalhosos.

Acredito que participar da equipe de Imprensa foi interessante para ganhar um amadurecimento e engajamento nesses eventos e iniciativas da Escola com os alunos. Foi bacana também poder fazer parte da produção desses registros que são memórias da história da SiV. Fico feliz que, mesmo depois de alguns anos, os alunos da Viva continuam animados para dar sequência a um trabalho que fazíamos. Desejo boas (e calorosas) discussões futuras!

Júlia Kóller

2016

Entrei na Viva na metade do meu primeiro ano do ensino médio. Pela minha natureza questionadora, sempre gostei de debater e nunca tive problemas expondo minhas opiniões - surgiu uma pressão imediata para participar da SiV. Acabei não participando da primeira edição, por ter acabado de chegar, e me arrependi instantaneamente.

Por natureza, a SIV, como qualquer outra simulação, é muito desafiadora, mas sempre acreditei que o verdadeiro valor de um exercício como este é representar o seu oposto. Portanto, optei pelo excelentíssimo Jair Bolsonaro. Confesso que, no auge da minha adolescência, tinha a arrogância de assumir que tais sujeitos eram muito simples e fáceis de representar por conta dos meus ideais na época. Estava errado, muito errado. Durante minha pesquisa, pude experienciar um pouco do outro lado e seus argumentos, me mostrando uma realidade nova. Não concordei, e ainda não concordo, com o posicionamento de tais sujeitos, mas tenho uma compreensão muito maior de suas motivações e complexidades.

Apesar de repudiar o Bolsonaro, tenho que admitir que tenho muito orgulho da minha participação em 2016 como este. Estudei muito o Bolsonaro, ao ponto de fazer uma imitação dos seus trejeitos: sotaque, maneirismos de fala, até o famoso: “Tá ok?”. Lembro que o tópico do debate era “Representação de Gênero na Mídia”, um prato cheio para o Bolsonaro. Fui fiel à personagem, briguei, quebrei decoro, provoquei o Jean Wyllys e até fui expulso na última sessão. Foi nesse momento que percebi o perigo que um sujeito como o Bolsonaro carrega. Sua falta de profundidade nos argumentos e intransigência são armas poderosíssimas na política. Me dei conta que ele poderia ser um forte candidato a presidência nas próximas eleições.

Acho que essa reflexão é o grande diferencial da SIV, sendo o elemento que a torna tão especial. Em 2018, representei a Croácia na SRMUN (Conferência de Modelo de ONU do Sul dos Estados Unidos) pela minha faculdade, e ganhamos diversos prêmios. Porém, não sou capaz de citar nada, nem sequer me lembro da minha resolução. Por isso, posso afirmar com absoluta certeza, que a SIV é a simulação mais especial da qual participei e me sinto honrado de ter feito parte desse projeto.

Rodrigo Nazarian


2017

A SiV de 2017 foi a primeira edição em que me inscrevi para participar sozinha. Foi um misto de medo com orgulho, pois o receio de falar em público vinha junto com a sensação de conquista pessoal. Finalmente eu estava ali como delegada solo da Bulgária, e essa atitude significou muito para o meu desenvolvimento pessoal. E, com certeza, o papel da SiV nessa conquista foi muito grande.

O tema da edição de 2017 foi Crise de Refugiados, e a escolha não foi à toa: o número de pessoas forçadas a se deslocar de sua origem naquele ano chegou a quase 69 milhões, levando a ONU alertar, na época, para o que seria a maior crise humanitária do século. A situação crítica também alimentava discursos e movimentos nacionalistas exigindo que as fronteiras fossem fechadas ou argumentando que os refugiados deveriam ir para outros países.

O mais legal dessas simulações é que sempre acabávamos aprendendo coisas que não eram passadas em sala de aula. Mesmo sendo um assunto tão importante naquele ano, era difícil que fosse discutido para além de algumas aulas de geografia. E nós não só tínhamos que estudá-los por conta, como também precisávamos incorporar o posicionamento da delegação representada. E nisso, acabávamos descobrindo coisas sobre a geopolítica de outro país e do mundo que nunca imaginaríamos saber. Tudo isso enquanto desenvolvíamos a oratória e a postura diplomática.

Viver tudo isso foi muito importante para o meu crescimento. E acho que eu só me dei conta disso quando já havia saído do Ensino Médio e passava por processos seletivos disputados. A SiV de 2017 me ajudou a perder um pouco do medo de me impor e a mostrar segurança quando falo, especialmente em um ambiente ainda tão masculino quanto esses fóruns de debates e, infelizmente, hoje, no curso que faço. E mesmo com todas as dificuldades, o estresse e a corrida contra o tempo para produzir um documento a tempo, esses dias de simulação ainda fazem parte de uma das memórias mais marcantes que tenho da Escola Viva.

Mariana Medeiros


2018

Minha última SIV, um sentimento de alegria e tristeza. Alegria porque eu iria fazer e participar de algo que gosto e valorizo muito, porém triste por ser minha última vez. Sabendo disso, decidi me preparar como nunca, seria um debate caloroso sobre a Intervenção Militar no Rio de Janeiro.

Como de costume, fiz um bom estudo do assunto, procurei inúmeras fontes e informações para poder estar o mais aguçado possível. Só que dessa vez levei muito a sério a questão do sujeito social, tive de assistir o Roda Viva inteiro e várias entrevistas do Jair Bolsonaro, até que consegui falar da mesma maneira que ele, modéstia a parte ficou muito bom.

Chegou o grande dia, hora de mostrar todo o trabalho e preparação, lembro de estar nervoso, mesmo sendo já experiente nessas coisas, e logo com meu discurso inicial percebi que estava voando, só que ao mesmo tempo os meus adversários também estavam muito bem preparados, a guerra estava instaurada, um debate quente, tenso e competitivo. Lembro de trocação atrás de trocação, cheguei até ser excluído de uma das sessões.

Essa SIV realmente foi inesquecível, não só pelo debate, mas também por me fazer lembrar que depois de tudo ainda estava tranquilo com todos, meus colegas e amigos, tudo era uma simulação.

Pedro Célia


2019

Desde a minha primeira experiência numa simulação, ao chegar em casa, tirar o crachá e sentar no sofá ao lado de meus pais, até a última reunião do comitê de organização da Simulação Viva de 2019 – e, mais uma vez, ao escrever este relato –, já perdi a conta de quantas vezes fui questionada acerca da minha experiência na SiV.

Poderia agora simplesmente ativar minha persona de representante-do-comitê-organizacional-responsável-por-passar-nas-salas-dando-avisos e escrever algumas poucas linhas sobre como a experiência nessa simulação me deu muitos e muitos frutos, em especial um “a mais” no meu currículo escolar. Mas se teve uma coisa que esses três anos – e, especialmente, o ano passado – me ensinaram foi que participar da SiV não se restringe apenas a um item adicional no currículo.

Qualquer participante da SiV pode lhe dizer que os poucos dias de simulação se acomodam de modo permanente em sua história pessoal. É quase impossível simplesmente esquecer das semanas antecedentes de estudo, das pesquisas, das conversas com os professores, do famoso dress code, da pressão de estar naquele ambiente de simulação por horas e horas, da dor de cabeça que é redigir e revisar um documento de trabalho e do frio na barriga que faz proferir um simples discurso de um minuto e meio (que demora uma eternidade).

No entanto, ninguém lhe conta como três professores, que inicialmente parecem apenas um trio de educadores que vemos toda semana, se tornarem seus maiores e mais sábios braços direitos. Não lhe dizem como é organizar uma sala de artes com carteiras cobertas de panos pretos, minicomputadores, blocos e blocos de anotações, microfones e copos de água em plena manhã de quinta-feira durante a aula de biologia.

Não se fala sobre a tensão que é adentrar os últimos minutos antes do início da primeira sessão e torcer para que tudo dê certo, nem do nervosismo, algumas sessões mais tarde, de estar prestes a anunciar a crise do comitê. Muito menos se relata como é ficar até quase dez horas da noite depois de um dia inteiro de debate numa salinha a metros do portão da escola (da rua! Do táxi! De casa! Da cama!) tentando pensar num jeito da crise dar certo. E, finalmente, ninguém nunca vai conseguir explicar-lhe o alívio que é um dos jornalistas da imprensa descobrir que a solução da crise está, na verdade, numa bendita corrente marítima chinesa.

Mas eu lhe digo como é, como integrante da mesa diretora, chegar em casa depois da última sessão, tirar o salto alto e sorrir um sorriso tolo de felicidade por, afinal de contas, ter dado tudo certo. Conto também como é, horas antes, olhar para todas aquelas pessoas que lhe ajudaram a preparar esse evento durante meses antes de finalmente bater o martelinho anunciando o fim da sessão.

Os sanduíches do coffee break, as risadas abafadas entre a mesa diretora no meio do debate, as piadas com os professores, checar o grupo de Whatsapp da sala à noite e não entender absolutamente nada sobre conteúdo na foto da lousa da aula de química naquela manhã e conversar com seus amigos em roupas casuais nos intervalos das sessões vestida de blazer e salto... são todos sentimentos que merecem nomes próprios para si. E, infelizmente, não consigo achar nenhum deles no dicionário – e acho que isso efetivamente constata o quanto participar da SiV é uma experiência tão particular, pessoal, única e impossível de ser esquecida.

Anna Maimoni